Evento reuniu especialistas e marca os 14 anos da Política Nacional de Resíduos Sólidos que tem como objetivo acabar com os lixões do país, meta ainda distante
Lúcia Rodrigues, Agência Indusnet Fiesp
O Workshop “Gestão Integrada e Compartilhada de Resíduos Sólidos”, realizado pela Fiesp na quarta-feira (7/8) é uma iniciativa que marca os 14 anos da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS).
O evento reuniu especialistas para debater os desafios que ainda persistem na implementação dessa política que é essencial para a gestão ambiental adequada e a transição para um modelo de economia circular.
A Política Nacional de Resíduos Sólidos, Lei nº 12.305, de 2 agosto de 2010, estabelece medidas sobre gestão de resíduos, coleta seletiva e reaproveitamento de materiais. Um dos grandes objetivos da Lei é acabar com os lixões e regulamentar a questão dos resíduos produzidos no país.
Na abertura, Kalil Cury Filho, diretor titular adjunto do Departamento de Desenvolvimento Sustentável (DDS) da Fiesp, disse que a implementação da PNRS ainda apresenta desafios, no sentido de assegurar a destinação final dos resíduos e a disposição final dos rejeitos de forma ambientalmente adequada.
“É necessário incentivar a transição para o aproveitamento desses materiais como recursos, rumo ao modelo de economia circular”, pontuou Kalil Cury.
Composto por dois painéis, mediados por Fabrício Soler, presidente do Instituto Brasileiro de Resíduos Sólidos (Instituto PNRS), o workshop reuniu especialistas que debateram os novos modelos e negócios para a circularidade de resíduos e os recursos e a gestão de resíduos rumo à economia circular.
Levantamento inédito elaborado pela Associação Brasileira das Empresas de Limpeza Pública (Abrelpe) aponta que o Brasil tem hoje quase 3 mil lixões ou aterros irregulares que impactam a qualidade de vida de 77 milhões de brasileiros. Para Soler, acabar com os lixões é um ponto fundamental dentro da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
“Não é por falta de normas que o Brasil tem lixão, é por falta de controle, por falta de fiscalização. Isso significa que precisamos avançar e as políticas públicas têm que vir ao encontro de medidas que induzam às condutas corretas”, afirmou Soler.
Pedro Maranhão, presidente da Associação Brasileira de Resíduos e Meio Ambiente (Abrema), disse que a forma correta de descartar o lixo são aterros sanitários. Como exemplo de case bem-sucedido, citou o município de Itacaré (BA). Após mais de 30 anos em meio à Mata Atlântica, o lixão a céu aberto da cidade foi fechado. O projeto em Itacaré é pioneiro e está inspirando mais cidades da região a encerrarem seus lixões.
Outros exemplos, segundo ele, são Alagoas e Mato Grosso do Sul, que também avançaram no tratamento correto de resíduos sólidos. “Para que isso acontecesse, houve a participação e pressão dos órgãos ambientais, do Ministério Público e dos Tribunais de Contas”, enfatizou Maranhão. A competência da gestão dos resíduos é dos municípios, mas de forma integrada com União e estados, segundo a legislação.
Paulo Petroni, presidente do Conselho Gestor do Instituto Rever, explicou que a instituição tem como missão auxiliar as empresas e suas entidades representativas a avançarem nas suas práticas de logística reversa, promovendo discussões técnicas para simplificar processos e operações de retorno e destinação final de embalagens após o seu uso pelo consumidor.
Ao gerenciar o Sistema de Logística Reversa de Embalagens em Geral, o Rever assumiu o trabalho exercido pela Fiesp desde 2018. O Rever é a primeira entidade gestora de sistemas de logística reversa de embalagens no país, atuando em todo o Brasil para incentivar ações de reciclagem e responsabilidade socioambiental na indústria, no comércio e nos serviços.
O trabalho do Instituto está focado no fortalecimento da indústria de reciclagem e no engajamento de todos os elos da cadeia – dos catadores e das empresas de limpeza urbana até os municípios e as empresas recicladoras.
“Toda essa transformação para a economia circular passa fundamentalmente pela educação nas nossas escolas, envolvendo as cooperativas e o Poder Público”, sublinhou Petroni.
Evaldo Azevedo, coordenador de Resíduos da Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do estado de São Paulo (Semil), apresentou o programa Integra Resíduos, lançado em junho deste ano, e que busca melhorar a gestão de resíduos sólidos por meio de parcerias público-privadas e da regionalização, por exemplo, via consórcios intermunicipais.
Com população de 45,2 milhões de habitantes, o estado de São Paulo gera, aproximadamente, 40 mil toneladas de resíduos sólidos diariamente, o que representa um gasto aproximado de R$ 6 bilhões por ano apenas para a destinação do lixo urbano.
“Hoje, 270 municípios já aderiram ao programa. A intenção é mobilizar a maior quantidade dos municípios para participarem do Integra, que cumpre as diretrizes do Plano Nacional de Resíduos Sólidos”, finalizou Azevedo.
Gestão de resíduos rumo à economia circular
No segundo painel, Fernanda Romero, gerente de Políticas do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), disse que a circularidade desafia o atual modelo econômico em direção a um futuro sustentável.
“Economia circular não é sinônimo de reciclagem, não é sinônimo de gestão de resíduos. Quando a gente fala de economia circular, a gente está falando de redução de resíduos. Esse é o nosso principal objetivo”, assinalou Romero.
Relatório do PNUMA alerta que a geração de resíduos sólidos urbanos pode crescer de 2,3 bilhões de toneladas em 2023 para 3,8 bilhões de toneladas até 2050. O custo direto da gestão de resíduos foi de US$ 252 bilhões, registrados em 2020, para US$ 640 bilhões por ano, custo que deve persistir até 2050. “Os dados do relatório são alarmantes, não dá pra gente ignorar tudo isso que a ciência tem nos apontado”, analisou Romero.
O presidente da International Solid Waste Association (ISWA), Carlos Silva Filho, um dos autores do relatório, ressaltou que o mundo continua em uma tendência de aumento da produção de resíduos sólidos. “Ainda temos cerca de 40% desses resíduos que vão parar em locais inadequados, tipo lixão e queima a céu aberto”, diz
De acordo com Silva Filho, se esse quadro não for revertido, pode haver impactos negativos no clima, com mais emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), principalmente metano, bem como na biodiversidade e na saúde humana, com maior poluição e impactos direto na qualidade do ar, água e solo.
Silva Filho apontou ainda que os índices de aproveitamento dos resíduos são bastante limitados no país e no mundo. Segundo o relatório, enquanto a média global de aproveitamento é de 19% e a do continente Sul-americano 6%, o índice de aproveitamento no Brasil varia em torno de 3% a 4% e está estagnado há mais de uma década.
Lucas Ramalho Maciel, diretor do Departamento de Novas Economias do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), disse que a transição para a economia circular traz inúmeros benefícios para o país, como a geração de renda e empregos baseados em negócios circulares, e a redução nas emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE).
Além disso, segundo ele, a economia circular abrirá um leque de oportunidades para novos negócios e serviços, gerando empregos verdes e qualificados em diversos setores. “O nosso governo tem avançado na economia verde e temos colhido alguns resultados positivos”, disse Maciel, citando o Plano de Transformação Ecológica
O Plano de Transformação Ecológica, lançado em 2023 pelo governo federal, prevê, principalmente, investimentos em infraestrutura. Entre as medidas, estão o mercado regulado de carbono, o estímulo à reciclagem e ampliação de áreas de concessões florestais.
Também participou do segundo painel, Natalia Biesiada, representando Marília Garcez, diretora de Estratégia e Inteligência da Agência Paulista de Promoção de Investimentos e Competitividade – InvestSP.